sábado, 2 de agosto de 2014

Uma História Gonçalense de Amor e Fé







Alex Wölbert*


Histórias de amor acontecem em todos os lugares do mundo, mas posso garantir que as que acontecem na nossa cidade são as mais belas.


Quando a linda jovem Mathilde Ferreira cruzou os olhos para o jovem imigrante português Francisco Rodrigues desabrochou como um botão de rosa o maior de todos os sentimentos. E nada nesse mundo, nada mesmo, mudaria o rumo dessa história de amor. Nem mesmo o pior dos desastres separaria o casal. Por pior que fosse, era como uma cabeça de alfinete perto da fé que Mathilde tinha no coração.

(Casal Francisco e Mathilde Rodrigues)

Era do pescado que Francisco tirava seu sustento. E em alto-mar Mathilde fazia companhia em seus pensamentos. Estava na hora de concretizar a união. Marcaram o casamento para o primeiro dia de junho de 1900.


E assim foi feito, naquela primeira sexta-feira do mês de junho. Todavia, por conta do compromisso com seu trabalho, Francisco nem teve tempo de curtir seu primeiro dia de casado ao lado da sua esposa Mathilde. Logo cedo saiu com a embarcação do cais de Neves e varou mar à dentro com mais 29 tripulantes a bordo.


Esperava que o bonito dia de sol e o frescor da brisa do mar fossem abençoar o seu dia e, tão logo a embarcação estivesse lotada de pescado, estaria em casa nos braços da sua amada.


(Ilustração da tempestade)

No entanto, Francisco estava enganado, pois eis que de repente, mais rápido que um piscar de olhos, o céu se cobrira com um véu negro, o vento começa a assobiar desesperadamente entre as cordas de sustentação da rede, raios brilhantes como flash varavam o céu e as ondas de 3 metros de altura, que batiam violentamente na embarcação, balançava, como um pêndulo desritmado no meio do oceano. Tamanha era a violência do sacolejo que Francisco é jogado de um lado para outro até que bate com a cabeça no mastro e apaga. Acorda com a água gelada e salgada alisando seu rosto. Francisco olha para um lado e para o outro à procura da embarcação e de seus companheiros, mas não vê nada, nem ninguém além de um tronco boiando próximo ao seu corpo. Mesmo cansado, lutando pela sua sobrevivência, Francisco agarra aquele tronco com todas as forças que lhe restavam. Sabia que aquele tronco era único caminho para manter-se vivo.


Enquanto isso Mathilde via o tempo passar olhando para frente da casa na esperança de que seu marido chegasse com o mesmo sorriso que a fez se apaixonar. No íntimo, Mathilde pressentia que ele não voltaria com aquele temporal, mas, em nenhum momento, perdera a fé, pois desde criança sempre foi católica e muito devota de São Pedro. Então se ajoelhou e orou com a maior de sua fé e fez uma promessa ao santo protetor dos pescadores. Se São Pedro trouxesse Francisco, seu esposo, são e salvo como prova de sua fé construiria dentro do terreno de sua casa uma capelinha para o santo de devoção. E Mathilde orou, ininterruptamente, os 3 dias e as 3 noites que duram a tempestade.

Passados 14 dias os corpos dos 29 pescadores, que estavam na embarcação, apareciam um a um sem vida. E todos, exceto Mathilde, perdiam a esperança de encontrar Francisco vivo. Eis que, naquele mesmo dia, ela teve a certeza de que os anjos existem, e foi através de um deles que recebeu a notícia de que Francisco estava vivo e que teria sido resgatado, em estado gravíssimo, a quilômetros de distância de onde ocorreu o acidente e havia sido levado imediatamente ao Hospital Municipal São João Batista, em Niterói. Mathilde não se conteve e de joelhos levantou as mãos para o céu agradecendo de todo o coração ao santo que confiou a vida de seu amado.

(Capela Centenária de São Pedro, Neves, São Gonçalo)

No hospital, ainda em estado delicado, Francisco não pode estar ao lado de Mathilde no dia 29 de junho, quando cumprira a primeira parte da sua promessa e mandou rezar a primeira ladainha para o santo diante de um quadro de São Pedro.

(Pintura centenária de São Pedro)

E foi a partir desse dia que a história do casal Ferreira Rodrigues não foi diferente de todas as outras histórias que possuem finais felizes. A recuperação de Francisco foi bem rápida e logo estava ao lado da mulher que amou para toda vida. Mathilde e Francisco tiveram 10 filhos, e a nenhum deles foi dado o nome de Pedro, mas como forma de agradecimento ao santo e a fé de sua esposa, fez um pedido à família para que o primeiro neto fosse batizado como Pedro. E assim foi feito, e junto com ele hoje são aproximadamente 20 descendentes em quatro gerações com o nome de Pedro na família.

(Interior da Capela de São Pedro, Neves, São Gonçalo)

Nada melhor do que terminar uma feliz história de amor com o famoso bordão “Foram felizes para sempre”. Sim, foi assim com Mathilde e Francisco que até o final das suas vidas contagiam a todos com seu amor e cativaram a devoção pelo santo que os uniu para eternidade.


Prestes há completar 114 anos, no dia 29 de junho de 2014, a Capelinha de São Pedro é prova viva desse amor e fé. Esta fica na Rua Nova de Azevedo, 421 em Neves, São Gonçalo. Atualmente é mantida pela neta do casal a senhora Mathildes é quem cuida dessa relíquia junto com a família e compartilha essa história linda por gerações.


Eis aqui a minha verídica história gonçalense de amor e fé. Onde em nenhum lugar deste mundo, nem sobre uma gôndola no cenário de Veneza bateria o esplendor da nossa história ocorrida no bairro de Neves em São Gonçalo.


Curiosidades:


- O primeiro quadro de São Pedro exposto na primeira ladainha realizada em 29 de junho de 1900 encontra-se em exposição na capela.


- A Capelinha não é aberta ao público e quem quiser visita-la deverá solicitar a família Ferreira Rodrigues.


Fontes:

Família Ferreira Rodrigues

Postado, originalmente, no Blog Tafulhar.
e, também, na página Simsãogonçalo

Sobre o Autor:
Alex Wölbert é colaborador do Blog Tafulhar. Considerado um dos maiores cronistas do Leste Fluminense, sobretudo, acerca da cidade de São Gonçalo-RJ. Faz parte do Projeto Recicla Leitores. Facebook: Alex Wölbert




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