João Ubaldo Ribeiro |
A surpresa me tirou do sério, sem dúvida, porque todos nós, seus leitores, ainda tínhamos muito que aprender com o brasileiríssimo João Ubaldo Ribeiro, de Itaparica e do mundo, sobre brasilidade e nossas coisas, de Itaparica, da Bahia e do Brasil, sobretudo do Brasil contemporâneo em que as amizades sinceras são raras e as muitas que existem por aí se orientam pelo interesse particular.
Com João era diferente. Tinha sincera amizade e amor aos itaparicanenses e muitos brasileiros, de quaisquer níveis, sociologicamente falando. Tanto dos que a ele procuravam se igualar, quanto dos que apenas sabiam apreciar o seu intelecto, suas criações literárias, seu riso fenomenal, sua fala mansa mesmo com a voz de barítono, como diria o nosso querido Ancelmo Gois, colega de O Globo. João é um dos que estão presentes, de corpo e alma, no Viva o Povo Brasileiro.
Li três dos seus livros: Sargento Getúlio, o Sorriso do Lagarto e Viva o Povo Brasileiro, mas nunca o abandonei porque sempre estava em sua companhia, sentindo o seu calor, sua voz e sua consciência, lendo-o nas crônicas dominicais de O Globo. Nelas, o nosso João colocava toda a sua verve dissertando sobre a política, as coisas da política, sobre os políticos e suas ações boas ou más, tendo como pano de fundo as inúmeras agruras do povo brasileiro.
João era alegre e viveu cada dia de sua vida com intensidade, assim imagino eu ao tentar recordar as suas belíssimas crônicas em sarcasmo, muitas das vezes, ou em brincadeirinhas ácidas e conversas diletantes com o seu Zecacomunista de Itaparica. Em suas crônicas, a política, os causos da política, os políticos e suas facetas, serviam de pano de fundo para a crítica dos farsantes.
João era do povo, vivia e convivia com o povo, daqui e do mundo, pois quando estava no Rio encontrava-se entre os amigos, gente pobre e rica, no bar e nas ruas. Quando estava em Itaparica, sua ilha e terra natal, encontrava-se entre os amigos, principalmente pescadores e feirantes, como os amigos: de alpercatas de couro ou sandálias comuns de borracha sintética, de bermuda e sem camisa. Informam os amigos deles e nossos, mas que nunca os vi.
Vivendo no Rio, ou caminhando pelo mundo a fora, sempre a serviço, a serviço da cultura, não importa se da literatura ou do futebol, estava em espírito na sua Itaparica. Em suas crônicas, publicadas em O Globo e no Estado de São Paulo, João Ubaldo Ribeiro mostrava essa sua universalidade. Estando onde estivesse, em Itaparica, no Rio ou no mundo, João era só brasilidade.
Mesmo com o seu passamento, sua migração deste para outro mundo, João continuará entre nós e sempre será lembrado pela sua obra grandiosa, não porque ele é um imortal, mas porque seus pensamentos, suas palavras e seu coração não nos deixarão, porque seus livros e suas crônicas nos farão lembrar sempre de sua presença eterna.
Vejam o exemplo de Machado de Assis, um dos fundadores da Casa a que João também pertence, igualando-se a outro João, o Guimarães Rosa; a um Euclides da Cunha, a um Jorge Amado, e tantos outros inquilinos da Casa dos Imortais, que se foram a tanto tempo, deixando de luto os brasileiros mortais, até hoje são lembrados com devoção e evocados por letrados e não letrados como pessoas incomparáveis nas peculiaridades de suas obras literárias.
João Ubaldo Ribeiro faleceu na madrugada de sexta-feira, dia 18 de julho de 2014, aos 73 anos de idade, com saudade dos mestres que estão escrevendo outras histórias na eternidade.
Sobre o Autor:
Pereira da Silva, Pereirinha, é conselheiro e presidente da Comissão de Sindicância da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e primeiro secretário da União dos Jornalistas e Comunicadores de São Gonçalo - UNIJOR
(postado, originalmente na página da UNIJOR)
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