terça-feira, 10 de maio de 2016

A família Ferreira da Silva


História gonçalense

A família Ferreira da Silva

 

                                    Texto de Jorge Cesar Pereira Nunes


       Uma das famílias naturais de São Gonçalo que se destacaram no cenário local e nacional nos séculos XIX e XX foi a Ferreira da Silva. Os chefes do clã eram José Ferreira da Silva (1805/1869) e dona Custódia da Cunha Ferreira da Silva (1811/13-11-1893), donos da fazenda Monte Formoso, em Cordeiros, e que ali fizeram vir ao mundo os filhos José Claro, Augusto Guanabara, Henrique Guatimozim, Belarmino, Brasília e América Brasília. José, pai, que chegou a tenente-coronel da Guarda Nacional e foi agraciado pelo imperador Pedro I com a medalha da Guerra da Independência (Bahia) e com o título de cavaleiro da Ordem de Cristo, por Pedro II, era conhecido como pândego por seus contemporâneos pelas grandes festas que realizava em sua propriedade, e era também grande orador, tendo sido um dos principais na homenagem póstuma à memória do coronel Antônio Vicente Gomes, em 5 de abril de 1864, ex-comandante do 2º batalhão da GN, de São Gonçalo. Em 24 de agosto de 1869, José faleceu e foi sepultado no Cemitério de Maruí, levando a viúva, cujos três filhos estavam na Guerra do Paraguai e ela só tinha a companhia de um filho e das duas filhas, a se mudar para o centro de Niterói. Dois anos depois, em 20 de dezembro de 1871, a Fazenda Monte Formoso era leiloada pela Justiça, para a partilha, entre os herdeiros, dos recursos financeiros daí resultantes. Porém, dona Custódia não gostava da “vidade grande” e por isso voltou para Cordeiros, instalando-se na Fazenda Restaurada, onde viria a falecer e ser sepultada no cemitério de Pachecos.


 

Imagem: José Claro Ferreira da Silva, óleo sobre tela, de Antônio Parreiras (1905), reprodução fotográfica de Helena Telles Barbosa.

 
As moças dedicaram-se às prendas domésticas. Brasília (?/05-07-1902) casou-se com o fazendeiro Pancrácio Frederico Carr Ribeiro (dono da Fazenda do Gambá, que deu origem ao atual bairro do Gambá; bacharel, vereador, juiz de paz, delegado de polícia, oficial da Guarda Nacional, cavaleiro da Ordem Imperial da Rosa e inspetor escolar provincial, falecido em 16 de julho de 1892). América Brasília (?/02-12-1914) consorciou-se com José Manuel Caetano da Silva e dele também enviuvou, não voltando a se casar.

         Os rapazes, no entanto, preferiram coisas mais movimentadas. Dos quatro, três alistaram-se como voluntários na Guerra do Paraguai e para as plagas do sul viajaram a fim de combater os vizinhos orientais que haviam invadido o território brasileiro. Apenas um, Belarmino, ficou aqui, para cuidar dos pais e das duas irmãs.  Os outros que foram combater os paraguaios seguiram carreira no Exército.

         Augusto Guanabara foi um deles. Nascido em 1849, formou-se em engenharia, fixou-se em Porto Alegre, onde trabalhou como engenheiro da Câmara Municipal, chegou a capitão de artilharia, tornou-se lente (professor de matemática) da filial da escola militar que ali existia, casou-se com Celina Nunes Pereira, filha do Barão de Santana do Livramento (Vasco Alves Pereira, 1819/1883) e de dona Rosa Nunes de Lima Miranda, e elegeu-se deputado provincial gaúcho. Porém, em fins de 1881, adoeceu e retornou para Niterói, onde os irmãos mais velhos residiam, e faleceu em 11 de janeiro de 1882, aos 31 anos de idade, sem deixar descendência, tendo sido sepultado no dia seguinte no Cemitério de Maruí. Poeta bissexto, Augusto teve um livro de poesias publicado “post mortem”.

         O outro foi Henrique Guatimozim. Nascido em 15 de outubro de 1851, comandou o batalhão “Boi de Botas”, em São Gabriel, RS, onde conheceu Olímpia Sara Abbot (Guatimozim Ferreira da Silva), casou com ela e gerou os filhos Gil, Diná, Maria Josefina e Henrique Carlos. Prosseguiu na carreira militar e chegou a marechal do Exército, patente com a qual faleceu em 1º de junho de 1931, na cidade do Rio de Janeiro.

         Na vida civil, mas com um pé na caserna, por meio da Guarda Nacional, em que chegou à patente de coronel, Belarmino nasceu em 26 de abril de 1844 na Fazenda Monte Formoso, em cuja capela foi batizado, tendo por padrinho o então futuro Barão de São Gonçalo. Casado com Maria Isabel de Almeida (e Silva), com ela teve 12 filhos, dos quais a ele sobreviveram Belarmino, Euclides, Rodolfo, Francisco e Antonieta (professora estadual em Pachecos). Eleito deputado provincial em duas legislaturas, pelo Partido Conservador, na década de 1870, recebeu elogio do governo imperial, em março de 1886, pelo zelo como funcionário da secretaria provincial de Justiça; nomeado em 27 de abril de 1889 comandante do 17º batalhão da reserva da Guarda Nacional em Niterói, assumiu o comando em 9 de maio seguinte; foi agraciado com a comenda de oficial da Ordem da Rosa pelo imperador Pedro II, no princípio de novembro de 1889; durante a Revolta da Armada (1893/1894), integrou a comissão de socorro às populações pobres de Niterói; ao comemorar bodas de prata, em 9 de fevereiro de 1898, o casal foi homenageado com o poema “Uma saudação”, de Alfredo Azamor; e foi declarado secretário perpétuo do Asilo de Santa Leopoldina, mantido pelos vicentinos niteroienses, por haver exercido aquele cargo nos últimos 24 anos de sua vida. Belarmino participou intensamente da campanha de arrecadação de recursos para a construção do mausoléu do cônego João Ferreira Goulart e foi o orador oficial em sua inauguração, no Cemitério de São Gonçalo, em 13 de novembro de 1904. Quase cinco anos depois, em 29 de outubro de 1909, o coronel Belarmino Ferreira da Silva faleceu e foi sepultado no cemitério de Maruí, em Niterói.

         O mais velho dos irmãos, José Claro Ferreira da Silva, nasceu em 12 de agosto de 1836 e, logo após completar 18 anos de idade, já era nomeado segundo tenente da 1ª companhia do Batalhão de Artilharia da Guarda Nacional, em São Gonçalo, conforme patente expedida em 19 de julho de 1855. Apresentando-se como voluntário para a Guerra do Paraguai, seguiu para a frente de batalha em 27 de fevereiro de 1865 e, depois de participar do cerco de Uruguaiana, RS, em 18 de setembro assistiu à rendição dos paraguaios, sendo-lhe conferida, dois dias depois, a medalha de prata pelo seu desempenho naquele episódio. Após fazer parte dos grupos de reconhecimento dos portos de Itapura e Candelária, combateu na vanguarda para a tomada de São Tomás, em 22 de fevereiro de 1866, o que lhe valeu elogios do tenente-general Manoel Marques de Souza (Conde de Porto Alegre, 1804/1875). Havendo combatido em Curuzu e Tapera, tais suas bravura e coragem ali demonstradas, José Claro foi agraciado com o título de cavaleiro da Ordem de Cristo, em 14 de março de 1867. Já capitão, em 12 de outubro do mesmo ano passou a comandar uma companhia de infantaria e nela integrou a primeira linha de atiradores, retirando-se apenas após o fim dos combates. Foi para o Chaco e participou das rendições de Humaitá e nas regiões alagadas de Surubibi, Piquiri, Porto Santa Teresa, Vileta, Porto de Santo Antônio e Angustura, onde assistiu à rendição das forças inimigas em 30 de dezembro de 1868. Seguiu para os combates de Piraju, Sapucaí, Barreiro Grande, Caraguataí, Vila Rica, São Joaquim e Vila do Rosário, tendo sido elogiado em ordens-do-dia do ministro da Guerra e em pronunciamentos na Câmara Legislativa Geral (hoje, Câmara Federal), durante o ano de 1869, em que se destacou no combate de 12 de agosto em Peribebui, onde, com o sargento Juvêncio Luiz Pacheco e o soldado Francisco Cristóvão Rogarells, invadiu uma trincheira inimiga, matou dois soldados paraguaios, tomou a bandeira e a entregou ao general comandante da divisão (tal bandeira ficou no museu da Polícia Militar do antigo Estado do Rio de Janeiro, até pelo menos 15 de março de 1975, quando ocorreu a fusão com o ex-Estado da Guanabara). Em 30 de maio de 1870, o imperador Pedro II concedeu-lhe as honras do posto de major do exército e o nomeou cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro. Em 1872, recebeu a Medalha Geral da Campanha do Paraguai em Ouro e as Medalhas de Honra conferidas pelos governos da Argentina e do Uruguai. Promovido a tenente-coronel e coronel, retornou ao Brasil e foi nomeado adjunto dos ajudantes da diretoria geral do Arsenal de Guerra, cargo que exerceu até fevereiro de 1873, quando passou à Intendência de Guerra, onde em abril se tornaria ajudante e, logo depois, diretor, posto exercido até janeiro de 1881.

         Já estabilizado por aqui, José Claro casou com Serafina Celeste Coelho Bastos da Silva (1857/31-01-1886), que lhe deu os filhos Serafina Celeste (falecida com 15 anos de idade, em 1901), Mário, João Brasílio e Ernesto. No mesmo ano de 1881, em janeiro, o imperador nomeou-o para a serventia vitalícia dos ofícios de 1º Tabelião do Público Judicial e Notas de Escrivão do Cível, Comércio, Crime, Execuções Cíveis e Comerciais e de oficial do Registro Geral de Hipotecas de Niterói, que assumiu em 7 de fevereiro, passando depois para igual cargo no 2º Ofício de Justiça, que exerceu até 1901, quando se afastou (abalado pela morte da filha) por motivo de doença. Sua morte ocorreu em 28 de agosto de 1908.

 
Jorge Cesar Pereira Nunes é Bacharel em Direito, Jornalista e Pesquisador da História de São Gonçalo.É, também, autor das seguintes obras:
A criação de municípios no Estado do Rio de Janeiro;
Chefes de Executivo e Vice-Prefeitos de São Gonçalo;
Dirigentes Gonçalenses - Perfis;
Crônicas Históricas Gonçalenses I e II.
 
 
Fontes: Almanaque Laemmert para 1859, província, p. 71.

             Atestado de óbito de José Ferreira da Silva, de 25-08-1869, arquivo da Câmara Municipal de Niterói.

             Relatório do Presidente da Província, Carlos Afonso de Assis Figueiredo, de 15-10-1889, p. 23.

             Correio Mercantil, 25-12-1848, p. 2.

             Echo da Nação, 12-04-1860, p. 2.

             A Pátria, 22-10-1859, p. 4; 07-04-1864, p. 2; e 18-03-1872, p. 2.

             Diário do Rio de Janeiro, 31-08-1869, p. 1.

              O Fluminense, 02-02, p. 2, e 06-02-1881, p. 2; 17-03-1886, p. 1; 02-01-1889, p. 2; 08-05-1889, p. 1; 06-11-1889, p. 1; 11-11-1894, p. 3; 08-02-1898, p. 2; 19-02-1898, p. 2; 14-11-1904, p. 1; 30-10-1909, p. 2; e 26-06-1944, p. 1 e 2.

             A Capital, 20-08-1908, p. 1.

             Jornal do Brasil, 13-12-1909, p. 4.

             O Imparcial, 03-12-1914, p. 7.

             Lúcia Regina Crisóstomo, descendente de José Claro Ferreira da Silva.

              Registro de óbito nº 267, de dona Custódia da Cunha Ferreira da Silva, no livro nº 2 de registro de óbitos do cartório do registro civil do segundo distrito de São Gonçalo, folhas 98 verso e 99.

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