terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Challita; colombiano, libanês e brasileiro


 

Colombiano, libanês e brasileiro

                                                                                  Jorge Cesar Pereira Nunes

 

            Uma das pessoas de ligação com São Gonçalo e cujos fatos locais foram esquecidos pela historiografia é o escritor, jornalista e diplomata Mansour (Youssef)Challita, que nasceu em Bogotá, na Colômbia, em 24 de dezembro de 1919, e faleceu no Rio de Janeiro em 12 de julho de 2013. Embora sua naturalidade fosse colombiana, a nacionalidade era libanesa porque seus pais, Joseph (Youssef)Challita e AdèleSfeirChallita (falecida no Líbano em 10 de março de 1967), ali estavam em missão diplomática e registraram o filho na embaixada libanesa, de acordo com o “jus sanguinis”, ou seja, o“direito de sangue”, princípio jurídico que só reconhece como nacional a pessoa nascida de pais nacionais.


            Pouco depois, Joseph e Adèle retornaram ao Líbano, onde o menino Mansour não apenas usufruiu a infância e a juventude, como estudou e se formou, na Universidade Jesuíta São José,em Filosofia e Letras, dali viajando para a França, em que obteve o diploma universitário em Direito, e em seguida para os Estados Unidos, onde se formou em Jornalismo pela Universidade de Boston. Espírito inquieto, veio ao Brasil em 1949, com visto temporário, retornou ao Líbano e decidiu fixar-se em território brasileiro, o que fez com o visto permanente obtido em 24 de setembro de 1952.

            Estabeleceu-se na cidade do Rio de Janeiro, para editar um jornal (que não se tornou realidade) destinado à colônia árabe, e fez longa carreira de jornalista, poeta, tradutor e escritor, destacando-se com a tradução do Alcorão e de toda a obra de Gibran Kalil Gibran. Além de escrever 57 livros em Português, quatro em Francês e um em Inglês, Mansourcolaborava com artigos para os jornais O Globo, Jornal do Brasil, Jornal do Commercio, O Fluminense, Correio da Manhã e as revistas O Cruzeiro e Manchete.De suas obras, duas receberam participação especialíssima: “Do Oriente Médio – Mosaicos”, lançada em 1974, teve prefácio do escritor brasileiro Jorge Amado, que também prefaciou, no mesmo ano, “Mil e Uma Noites”. Alguns de seus escritos foram transformados em peças teatrais, entre as quais a tradução de “Parábolas”, de Gibran Kalil Gibran, foi adaptada como “Sete Parábolas”, e ficou em cartaz no Teatro Pedro Jorge,em 1974, e “Um Encontro Esplendoroso com Gibran”, também baseado em tradução de Mansour, foi encenado no Teatro Nelson Rodrigues (ex-BNH), em 1988.

            Criada em 1945, a Liga dos Estados Árabes designou-o, em 1957, como seu primeiro delegado no Brasil, cargo que ocupou até julho de 1975, quando ela foi transferida para Brasília. Radicado no Rio de Janeiro, ele recebera, em 1969, a Medalha Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, e a comenda de honra da Ordem Imperial Constantiana Militar de São Jorge, conferida por seu dirigente, Igor CommenePaleologue, além da Ordem Nacional do Cedro, no grau de comendador, que lhe foi conferida pelo presidente libanês Elias Hrawy (1926/2006), em 1996, entregue pelo embaixador GaziChidiac em ato realizado no Consulado Geral do Líbano no Rio de Janeiro; Mansour foi, também, diretor-geral do Conselho Nacional do Turismo, do Líbano, de 1967 a 1970: implantou a União Libanesa Mundial no Brasil em 1969 (em breve retorno a este País), criou a Associação Cultural Internacional Gibran (que presidiu até sua morte) e a Associação dos Amigos do Líbano, em 1980, entregou a cada membro da Academia Brasileira de Letras um exemplar sua tradução de “O Alcorão”, para que eles entendessem as razões dos muçulmanos; havia se tornado, em 1972, sócio do Clube Excursionista Brasileiro, vindo a ser, dez anos depois, da Associação Brasileira de Imprensa, de que foi sócio por indicação do presidente Austregésilo de Athayde (Belarmino Maria Austregésilo Augusto de Athayde, 1898/1993); em 1983, o presidente da República, João (Batista de Oliveira) Figueiredo (1918/1999), ao receber grupo de estudantes, recomendou-lhes ler “A Arte da Política”, de MansourChallita, para entenderem as dificuldades dela resultantes; em 1985, Mansour liderou manifestação de cerca de 100 libaneses, em frente ao hotel Copacabana Palace, onde estava hospedado o presidente francês François Mitterrand (1916/1996), pedindo a apoio da França às iniciativas de paz no Líbano; e ainda teve tempo de fazer conferências em vários municípios fluminenses, como na Câmara Municipal de Vassouras, em 1980, e na Casa de Cultura de Araruama, em 19 de junho de 1993.

            Mansour Chalita viu ser realizada prova especial no Jóquei Clube Brasileiro, em 19 de março de 1972, pelos 27 anos da Liga dos Estados Árabes, promoveu o Primeiro Festival de Cultura Árabe no Brasil, em agosto do mesmo ano, no Palácio Guanabara, mês em que também recebeu homenagem da Assembleia Legislativa do extinto Estado da Guanabara; em 1971, editara o jornal “Hifen”, de ligação entre árabes e brasileiros, e entregou vários exemplares ao presidente do Líbano, Suleiman (Kabalan)Frangieh (1910/1992), no momento em visita ao Brasil; coube-lhe, em 1973, realizar na cidade do Rio de Janeiro Fórum Econômico de que resultou a criação da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira; foi agraciado, ainda, com os títulos de Cidadão Carioca e Cidadão Fluminense, pelas Assembleias Legislativas dos antigos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro; em 1994, recebeu do ministro da Marinha a Medalha Mérito Tamandaré.

            Toda esta biografia ignora, entretanto, que talvez o primeiro artigo escrito por MansourChallita em território nacional haja sido em São Gonçalo. Com vários familiares aqui residentes e comercialmente estabelecidos (ainda hoje), ele estava há menos de quatro anos no Rio quando veio a São Gonçalo, em 1955, cuidar de interesses particulares, alguns dos quais dependiam da Prefeitura. Por isso, dirigiu-se à sede do Poder Executivo e, surpreso, foi imediatamente atendido pelo prefeito Joaquim Lavoura (1913/1975), que gostava de estar fisicamente à frente das obras executadas por sua então primeira administração, mas nos momentos que passava em seu gabinete atendia a todos que o procurassem. Mansour explicou-lhe seus problemas e Lavoura solucionou imediatamente “todos os que estavam de acordo com a lei”, conforme fez questão de frisar. O impacto foi tão grande que Mansour resolveu escrever um artigo sobre o prefeito, e o publicou em partes no jornal O São Gonçalo (nas edições de 02, 05, 09 e 12 de fevereiro de 1956), então dirigido por seu fundador, jornalista Belarmino de Mattos.

Jorge Cesar Pereira Nunes é Bacharel em Direito, Jornalista e Pesquisador da História de São Gonçalo.
É, também, autor das seguintes obras:
A criação de municípios no Estado do Rio de Janeiro;
Chefes de Executivo e Vice-Prefeitos de São Gonçalo;
Dirigentes Gonçalenses - Perfis;
Crônicas Históricas Gonçalenses I e II.



 


Fontes: Dicionário de Orientalistas de Língua Portuguesa, verbete “MansourYoussefChallita”, Lisboa, Portugal.

              Associação Brasileira de Imprensa, proposta de sócio nº 15.720, de 29-11-1982.

        Arquivo Nacional, Fundo de Imigração, Cartões de Imigração de 1949 e de 1952.

              Liga dos Estados Árabes no Brasil.

              Consulado do Líbano no Rio de Janeiro.

              O São Gonçalo, 02, 05, 09 e 12-02-1956, todos p. 1.

 OFluminense, 27-06-1981, p. 12; 13-01-1985, caderno Encontro, p. 1; 23-11-1985, p. 11; e 08-09-1991, caderno Encontro, p. 3.

              O Jardim Árabe, junho/julho de 1995, p. 8.

Diário de Notícias, 19-03-1972, p. 7; 18-06-1972, 3º caderno, p.24; 30-07-1972, p. 13; 28-02-1973, p. 4; 19-02-1974, p. 5; 14-06-1974, p. 5; 06-09-1974, p. 21; 06-09-1974, p. 21; 22-07-1975, p. 3; 25-11-1975, p. 8; e 18-04-1976, p. 35.

Jornal do Brasil, 06-12-1970, p. 50; 01-02-1971, p. 9; 27-02-1971, caderno Livro, p. 11; 18-03-1972, p. 10; 14-08-1972, p. 20; 17-11-1973, caderno Livro, p. 3; 19-02-1974, caderno Livro, p. 2; 06-07-1974, caderno B, p. 2; 06-07-1974, caderno Livro, p. 1; 07-04-1976, caderno B, p. 8; 29-10-1977, caderno Livro, p. 2; 03-11-1978, caderno B, p. 7; 12-08-1979, caderno Especial, p. 4; 19-01-1980, p. 11; 02-03-1980, p. 11; 02-04-1980, caderno B, p. 2; 08-05-1980, p. 10; 28-07-1980, p. 11; 08-08-1980, p. 11; 01-10-1980, p. 11; 25-10-1980, caderno B, p. 11; 29-10-1980, caderno B, p. 2; 27-11-1980, p. 9; 12-04-1981, p. 10; 20-06-1981, caderno B, p. 2; 27-11-1980, p. 9; 12-04-1981, p. 10; 20-06-1981, caderno B, p. 11; 23-11-1981, p. 11; 04-12-1981, p. 10; 13-12-1981, p. 10; 25-03-1982, p. 11; 13-05-1982, p. 11; 13-05-1982, p. 10; 24-05-1982, p. 11; 05-06-1982, p. 10; 10-07-1982, p. 1 e 11; 11-07-1982, p. 28; 17-07-1982, p. 1 e 11; 30-09-1982, p. 1 e 11; 11-10-1982, p. 1 e 11; 25-01-1983, p. 4; 19-03-1983, p. 11; 21-05-1983, p. 11; 30-09-1983, p. 11; 02-11-1983, p. 11; 12-11-1983, p. 11; 27-11-1983, caderno do Líbano, p. 8; 04-02-1984, caderno B, p. 2; 03-03-1984, p. 10; 31-03-1984, p. 10; 16-08-1984, p. 11; 27-02-1985, p. 11; 05-07-1985, p. 10; 17-10-1985, p. 4; 05-02-1986, p. 11; 30-04-1986, p. 11; 12-05-1986, p. 10; 31-07-1986, p. 11; 16-08-1986, p. 10; 10-09-1986, p. 10; 22-11-1986, 10; 24-11-1986, p. 11; 22-12-1986, p. 11; 15-03-1987, p. 10; 21-05-1987, p. 10; 30-08-1987, p. 10; 10-11-1987, p. 11; 30-01-1988, p. 8; 21-05-1988, caderno Ideias, p. 11; 30-05-1988, p. 10; 08-08-1988, caderno B, p. 5; 08-09-1988, p. 8; 12-02-1990, p. 8; 12-05-1990, p. 10; 25-11-1990, p. 10; 25-02-1991, caderno B, p. 1; 09-12-1991, 9; 17-12-1991, p. 13; 24-12-1991, p. 9; 15-02-1992, caderno Ideias, p. 10; 22-02-1992, p. 8; 30-05-1992, caderno Ideias, p. 1; 29-07-1992, p. 10; 18-06-1993, caderno Programa, p. 40; 28-08-1993, p. 4; 31-03-1994, p. 10;21-11-1994, p. 11; 11-01-1995, p. 10; 22-04-1995, p. 8; 10-06-1995, caderno B, p. 3; 19-06-1995, p. 10; 23-08-1995, p. 6; 22-11-1995, p. 9; 04-12-1995, p. 8; 18-09-1996, p. 11; 09-10-1996, p. 25; 03-05-1997, p. 22; 08-09-1997, p. 8; 30-10-2001, caderno B, p. 1 e 2; e 13-04-2002, caderno Ideias, p. 7.

Correio da Manhã, 21-03-1972, p. 15; 16-08-1972, p. 20; 07-08-1973, p. 2; e06-10-1973, p. 3.

O Cruzeiro, 07-07-1971, p. 84; 17-11-1971, p. 98; 23-08-1972, p. 42; 15-08-1973, p. 51; 12-09-1973, 50; 10-10-1973, p. 50; 31-10-1973, p. 50; 12-12-1973, p. 50; 13-03-1974, p. 42; 05-06-1974, p. 28; 28-08-1974, p. 26; e 30-08-1982, p. 7, 8 e 9.

 

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