(Texto de Jorge
Cesar Pereira Nunes)
Nascido em Arrozal, Piraí, RJ, em três de agosto
de 1877, Aníbal José dos Santos Nora (filho de Bazílio José dos Santos Nora e
Maria Rita dos Santos Nora) formou-se cedo como reverendo pela Igreja
Presbiteriana do Rio de Janeiro, quando ela era ainda incipiente no Brasil. No
afã de estendê-la, aceitou a missão de implantá-la em Alto Jequitibá, MG, onde
chegou em nove de setembro de 1908. Em 45 dias, percorreu toda a região que
caberia à sua administração e, noivo, retornou à cidade do Rio de Janeiro para
casar-se, em 21 de novembro, com Constância [Lemos] Nora (filha de Francisco
Paulo Pereira Lemos e Joana Assinore Lemos). A lua de mel foi rápida e já no
dia três de dezembro chegava de novo a Alto Jequitibá. Em oito de novembro de
1911, inaugurou o novo templo e ensinou aos fiéis que a grande festa anual
haveria de ser sempre sete de setembro, por ser não só a de independência do
Brasil como a de liberdade religiosa no Brasil.
Porém, ele e a esposa viram que era preciso fazer
mais do que somente a difusão do Evangelho: como não havia escolas primárias em
número suficiente para atender a todas as crianças locais, criaram uma, em
1917, recebendo 70 alunos no andar superior da casa paroquial. Foi o embrião do
que viria a ser o Ginásio Evangélico, sob a divisa “O temor de Deus é o
princípio da sabedoria”, e é o atual Colégio Evangélico, que ainda existe
naquela cidade mineira.
(imagem, tafulhar.com.br) |
Suas atividades eram tantas e tão produtivas, que
ele foi encarregado de várias missões em diversos pontos do território
nacional, de 1927 a 1940, até que, neste último ano, foi encarregado de
implantar a Igreja Presbiteriana em São Gonçalo. Era 14 de julho quando ele
começou suas pregações em uma casa alugada no bairro Barro Vermelho. Espaço
insuficiente para abrigar o crescente número de fiéis, começou a procurar uma
área maior e em ponto mais central do município. Motivou-o o fato de haver sido
procurado por uma família que precisava de um barraco para residir. Via que,
aqui, o problema maior não era a falta de escolas, mas a inexistência de abrigo
para pessoas carentes. Afinal, somente uma instituição social, o Asilo Amor ao
Próximo, estava em funcionamento e apenas uma segunda, o Abrigo do Cristo Redentor,
estava em vias de inaugurar-se, mas ambas ainda eram insuficientes para atender
a demanda.
(imagem, osaogoncalo.com.br) |
A família que o procurara contara uma história
muito comum na cidade desde o século XIX: alugara um terreno em fazenda,
plantara-o com um belo laranjal e, quando vieram os frutos, o fazendeiro rompeu
o contrato e alugou a mesma área para outra pessoa, a valor bem alto, pagando
àquela família uma indenização de 5 mil réis por suas benfeitorias, valor todo
usado para o pagamento de dívidas, inclusive com o dono das terras. Esta era
uma prática tão comum (apesar de altamente injusta) que já em 1827 lavradores
das freguesias de São João Batista (futura Niterói) e de São Gonçalo requereram
à Câmara de Deputados da Assembleia Legislativa Geral do Império, na corte, que
os arrendamentos fossem reduzidos a aforamentos perpétuos, para evitar que os
proprietários fizessem nova locação com avaliação lesiva das benfeitorias. Na
sessão de cinco de julho daquele mesmo ano, os legisladores indeferiram o
pedido com base em parecer da Comissão de Legislação, firmado pelos deputados
Antônio de Souza Teles, José Gregório de Miranda Ribeiro, José da Cruz
Ferreira, Antônio Augusto da Silva e José Carlos Pereira Torres, alegando
tratar-se de ataque ao direito de propriedade. Mais de cem anos depois, o
panorama era o mesmo.
Era preciso encontrar uma solução e ela seria
muito custosa, sabia-o Aníbal Nora, pois o terreno haveria de ser
suficientemente grande para receber a igreja e também um asilo. Com fé, ele foi
para o centro da cidade e eis que encontra Manoel Pita, também evangélico, mas
da Igreja Congregacional, que lhe segredou: estava à venda, sem ser anunciado,
um terreno na Rua Francisco Portela, 2767, ao frente ao que eram as ruínas do
armazém de José Alves de Azevedo, o “Zé Garoto”, e que foi o antigo Fórum de
São Gonçalo e hoje (2017) é sede da Câmara Municipal. Era ótimo, mas caro, pelo
tamanho e pela localização: 10 contos de réis. Nora recorreu a um cunhado, que
prontamente lhe emprestou 8 contos de réis e passou a fazer coleta com outros
companheiros, até juntar a importância e ir ao proprietário do imóvel, advogado
João Francisco da Matta (1893, São Gonçalo/1960, Niterói), que, embora
católico, ficou entusiasmado com a proposta social e vendeu a área por 9 contos
de réis, destinando um conto de réis para as obras que viriam a seguir. Com
trabalho voluntário e compras de material a prazo no comércio local, Nora
conseguiu, já em 10 de novembro de 1941, inaugurar o prédio principal do Lar
Samaritano (que fora juridicamente fundado em março anterior), tendo como
orador principal da solenidade o reverendo Galdino Moreira. Assim, ele abrigou
imediatamente a família de agricultores que o procurara um ano antes e começou
a acolher idosos.
(imagem, slideshare.net) |
Mesmo aposentado, em 1948, das funções de
reverendo, Aníbal Nora continuou olhando pelo Lar Samaritano, na condição de
presidente honorário, até seu falecimento (sem deixar descendentes), em 15 de
janeiro de 1971. E, nesses 23 anos, continuou a evangelizar; declarou, em 1951,
a senhora Alzira Vargas do Amaral Peixoto (primeira dama do antigo RJ) presidente
de honra da instituição; publicou vários livros (entre eles, “Explicação
Popular do Apocalipse”, na década de 1950, pela editora O Puritano, e “Verdades
Luminosas”, em 1962, pela editora Princeps); defendeu, em 1943, a utilização
das áreas saneadas pelo governo federal na Baixada Fluminense por agricultura
permanente, com o plantio de eucalipto, coco da Bahia, mamona, soja e maniçoba;
e participou do Movimento Popular de Alfabetização lançado pelo governador
Roberto Silveira, instalando uma escola para adultos, que recebeu seu nome, em
Pachecos, inaugurada pelo próprio chefe do executivo estadual em cinco de abril
de 1960. Aníbal Nora é patrono de rua no bairro do Coelho e a direção geral do
Lar Samaritano neste ano de 2014 é ocupada pelo reverendo Genésio Ferreira,
responsável pelo atendimento a 65 internos (24 masculinos e 41 femininos) que
ali se encontram.
A criação de municípios no Estado do Rio de Janeiro;
Chefes de Executivo e Vice-Prefeitos de São Gonçalo;
Dirigentes Gonçalenses - Perfis;
Crônicas Históricas Gonçalenses I, II e III.
Jorge Cesar Pereira Nunes é Bacharel em Direito, Jornalista e Pesquisador da História de São Gonçalo.
É, também, autor das seguintes obras:A criação de municípios no Estado do Rio de Janeiro;
Chefes de Executivo e Vice-Prefeitos de São Gonçalo;
Dirigentes Gonçalenses - Perfis;
Crônicas Históricas Gonçalenses I, II e III.
Fontes: Anais
da Câmara dos Deputados da Assembleia Geral Legislativa do Império, em 1827,
página 584.
Registro de casamento nº 208, do
livro nº 15, páginas 72 verso e 73, do Cartório da 7ª Circunscrição da Cidade
do Rio de Janeiro.
As Ruas Contam Seus Nomes, de
Emmanuel de Macedo Soares, página 540.
Relato do reverendo Aníbal Nora,
feito em 1965.
O São Gonçalo, 09-11-1941, p. 2; e 12-01-1948, p. 1.
A Noite, 25-05-1943, p. 9; e
05-10-1951, p. 11.
Correio da Manhã, 06-04-1960, p.
4.
Ótima história e ótima reportagem! Como faço para ter acesso às fontes? Me interessei principalmente sobre o livro Relato do reverendo Aníbal Nora.
ResponderExcluirVeja a resposta por favor, abcs
ExcluirBruno, perdão, só pude acessar hoje, vou verificar e te retorno aqui o mais breve possível, grato.
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