1.180 km separam nossa
cidade de Brasília, e quem dera que fosse somente essa a distância entre os
políticos de lá e de cá. O caminho da emenda parlamentar é cercado de dúvidas e
falta de transparência.
O
orçamento federal é elaborado pelo poder Executivo, sendo a participação de
deputados e senadores restrita à alteração do projeto encaminhado pelo
Executivo, podendo ser aprovado ou não. Umas dessas alterações é a chamada
emenda parlamentar. As emendas parlamentares são solicitações realizadas pelos
membros do Legislativo para inclusão de verbas específicas, como pavimentação
de ruas ou construção de uma unidade de saúde.
O
caminho parece simples, mas na verdade exige capacidade de articulação política
e muita paciência daqueles que necessitam dos recursos. Isso porque a liberação
dos recursos depende de aprovação do Executivo, que normalmente as concede em
contrapartidas políticas, como aprovação de matérias do governo. Tentando
esvaziar o poder do Executivo, em 2015 foi aprovada uma Emenda Constitucional
obrigando o empenho destas emendas com duas regras: até 1,2% das
receitas da União e metade das emendas sendo destinadas à área da
saúde.
No
orçamento federal de 2017, discutido e aprovado no ano passado, foram
destinados cerca de R$ 9 bi em emendas parlamentares individuais,
ficando cerca de R$ 15,3 mi para cada deputado e senador, podendo
ser divididos em até 25 emendas. Este valor pode ser encaminhado
para quaisquer entidades públicas ou privadas, de maneira específica como a
construção de uma escola em determinado município.
FASE
1 — Para ter sua emenda aprovada, o parlamentar precisa
apresentar detalhes e justificativas do uso daquele recurso em uma comissão
interna do Congresso Nacional. A comissão é responsável por julgar se as
emendas daquele parlamentar estão dentro dos limites constitucionais. Em caso
de uma emenda negada, o parlamentar não pode apresentar uma emenda substituindo
a anterior. Começa aqui parte do problema. Muitas emendas são apresentadas fora
do prazo e contendo inconsistências, o que acaba inviabilizando sua aprovação.
No caso de parecer favorável, a emenda fica sob status de APROVADA.
FASE
2 — Com a aprovação da Emenda Constitucional 86 em 2015,
as emendas passaram a ser impositivas, ou seja, após aprovadas o Governo
Federal tem de empenhá-las no ano fiscal programado. O objetivo foi acabar com
a barganha entre os poderes, onde o Executivo liberava as emendas em troca de
apoio no Legislativo. Após autorizada na comissão interna, é realizada uma
tomada de preços para saber de fato, o valor necessário para a realização
daquele investimento. Feita a tomada de preços, a emenda adquire status
de EMPENHADA, dentro do limite do valor autorizado, estando
liberada para ser aceita pelo proponente.
Agora,
a estratégia passou a ser liberar as emendas em datas próximas as eleições para
os aliados e somente depois do pleito para os opositores. Bem republicano, não
é mesmo? Você deve estar pensando: “pelo menos agora as emendas tem de chegar
no meu município”. Nunca é tão simples quanto parece. Após empenhadas, ou seja,
autorizadas pelo Executivo, as emendas entram em um cenário de Silent
Hill, onde poucos sabem o que de fato acontece com elas.
FASE
3 — Após o empenho das emendas, elas ficam disponíveis
para execução, com isso, o proponente, que é quem irá receber, é notificado
sobre a disponibilidade da emenda. A partir daqui, a capacidade técnica dos
gestores é fundamental, isso porque, antes de ser executada, é necessário
apresentar toda a comprovação técnica para a realização de obras, como laudos,
licenças e planos de trabalho. Outro ponto importante está na responsabilidade
financeira das emendas. Por exemplo, no caso de uma emenda para a construção de
uma unidade de saúde, o município precisa comprovar que possui recursos para
equipar e manter aquela unidade. Bem lógico né? Com todo o parecer técnico
apresentado, as emendas são EXECUTADAS, que é o início das obras.
FASE
4 — Após a execução da obra, a emenda pode ser PAGA pelo
Governo Federal ao município, que então pode pagar à construtora em caso de
terceirização, ou repor o caixa em caso de obra feita pela Prefeitura. Deu pra
entender?
Contudo
há uma série de dificuldades para a execução e pagamento das emendas. Já deu
pra ver que o Governo Federal só paga a emenda depois de executada, ou seja, o
município para iniciar uma obra, precisa alocar recursos próprios, o que muita
das vezes não acontece devido a penúria em que se encontram os orçamentos
municipais. Outra montanha no meio do caminho são as prestações de contas.
Muita das vezes o pagamento das emendas é feito de maneira parcelada. Digamos
que uma emenda de R$ 300 mil seja paga em três parcelas iguais. O Governo
Federal só libera a segunda parcela depois de saber onde foi gasta a primeira. A
incapacidade técnica e os esquemas de corrupção muita das vezes impedem uma
prestação de contas regular, o que inviabiliza a chegada de mais recursos.
Há
também um pano de fundo político nisso tudo: porque Nanci, por
exemplo, aceitaria uma emenda do deputado Dejorge, seu eventual
adversário em 2020 e que mantém uma forte oposição na Câmara de Vereadores?
Nanci estaria justamente favorecendo seu principal adversário, que poderia
fazer o discurso que encaminhou n milhões em emendas para a cidade. Indo além,
os eventuais candidatos apoiados pelo prefeito, poderão dizer aos cinco
distritos que o deputado não trouxe uma emenda sequer para a cidade. Complicado
né?
Toda
essa nebulosidade em torno das emendas podem ser comprovadas com os seguintes
dados da plataforma SIGA Brasil, do Senado Federal: para o
Orçamento de 2017, fora autorizado pela comissão, R$ 9,1 bi. Até a última
atualização da plataforma, 31 de julho, 45,5% das emendas haviam sido
empenhadas, cerca de R$ 4,1 bi. Contudo, somente cerca de R$ 17 mi haviam sido
de fato executadas, ou seja, nem 1% das emendas empenhadas.
Mas
e o governo Nanci? Está participando dessa festa orçamentária? Ainda não, mas
os convites já começam a chegar. Três para serem exatos: R$ 3,9 mi de
Altineu Cortes, R$ 535 mil de Marco Antonio Cabral e R$
1mi de Pedro Paulo, estão empenhados, mas nenhuma foi executada até o
momento. Cabe lembrar que o Governo Federal tem até dezembro para empenhar, ou
seja, liberar as demais emendas autorizadas pela comissão.
Em
2016, Neilton Mulim foi bem eclético no recebimento de emendas,
atingindo um total de R$ 3,6 mi de sete parlamentares: R$ 387 mil de Alexandre Valle, R$
599 mil de Cabo Daciolo, R$ 474 mil de Celso Jacob, R$
989 mil de Chico D’Angelo, R$ 300 mil de Jean Wyllis, R$
400 mil de Marcos Soares e R$ 451 mil de Soraya Santos. Quase tudo destinado à saúde, com exceção da
emenda do deputado Marcos Soares destinada à Sec. de Desenvolvimento Social.
Nossos vizinhos Niterói e Itaboraírec eberam,
respectivamente, R$ 7,1 mi e R$ 9,0 mi em
2016. Já este ano, foram empenhados R$ 500 mil em ambos os
municípios, também não executadas ainda.
Bom,
já deu pra perceber que o caminho das tão sonhadas emendas parlamentares não é
nada fácil não é mesmo? É bem possível que você, leitor, encontre informações
diferentes destas que eu apresentei, afinal, este é um daqueles assuntos que
ninguém sabe muito bem como funciona e quem sabe não conta de jeito nenhum.
Muito bom!
ResponderExcluirTambém achei excelente, abre um pouco os nossos olhos.
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