sexta-feira, 23 de maio de 2014

Rotas do Colégio São Gonçalo: Os Ônibus Que Marcaram a História do Transporte Brasileiro

(Texto de José Eduardo Testahy dos Santos Júnior* e arte final de Tafulhar)

   Fundado em 1941, pela professora Maria Estephânia de Carvalho e pelo seu esposo Zeno Bellido de Carvalho, o Colégio São Gonçalo é sinônimo de inovação. Foi a instituição de ensino particular de São Gonçalo que idealizou o desfile cívico de 22 de setembro – data em que se comemora a emancipação política da cidade – e foi o pioneiro em disponibilizar transporte escolar próprio para seus alunos.


A ideia, em disponibilizar transporte escolar, surgiu devido à grande extensão territorial de São Gonçalo, composto por 92 bairros, e a dificuldade de acesso ao transporte público pelas crianças e jovens. Isto gerava ociosidade na quantidade de matrículas do colégio. Para solucionar o problema, o diretor e um dos donos, Helter Barcellos resolveu adotar o transporte escolar em meados da década de 1970. 

"Lembro-me bem de quando criei as rotas do Colégio São Gonçalo. Era na época da segunda crise mundial do petróleo, na década de 1970. O Colégio comprou cinco ônibus a prazo da (empresa) 1001. Eram ônibus usados. Quatro andavam pelas quatro primeiras rotas: Dr. March, Porto Velho, Alcântara e Mutuá. Um ficava de reserva para qualquer enguiço dos demais. Não se pagava nada. Os ônibus eram inteiramente grátis. Chamaram-me de louco. Como, numa época em que os combustíveis subiam loucamente eu tinha a loucura de oferecer de graça algo que estava se tornando cada vez mais caro. Certamente eu iria falir! Não levavam em conta que o Colégio tinha uma grande ociosidade e que o preenchimento dessa ociosidade daria para pagar toda a despesa e o investimento e ainda nos daria um belo lucro. Eu havia calculado tudo. Resultado: em dois anos o Colégio estava pondo aluno pelo ladrão... Aí todos os outros colégios aderiram ao transporte escolar para não perder a concorrência. Eu me divertia muito,  pois todos aqueles que riam de mim agora seguiam meus passos. Infelizmente a avareza dos meus colegas de direção do colégio levou-nos a terminar com a gratuidade integral do transporte. Eles sempre estavam pensando em ganhar mais... Posteriormente, quando saí da escola em 2005 resolveram, logo após, acabar com o transporte. E acabaram com o Colégio. Pena ! A burrice e a ganância das pessoas acabam com coisas bonitas como a história do transporte escolar do CSG". (Prof. Helter Barcellos, ex-diretor e um dos donos do Colégio São Gonçalo).

            Cinco ônibus usados foram comprados à prazo da Auto Viação 1001. Inicialmente, eles eram inteiramente gratuitos, o que atraiu novos alunos e manteve os que já estavam matriculados. Quatro deles faziam suas rotas pelos diferentes bairros, enquanto um servia de reserva caso algum deles enguiçassem:

Centro – Barreto
Centro – Porto Velho
Centro - Mutuá
Centro – Alcântara


As rotas que fizeram parte da história do Colégio São Gonçalo e do Brasil

   Metropolitana 1970 - na época que pertencia à 1001
   



Metropolitana 1970 - Como Oficina - em seus últimos anos no Colégio São Gonçalo. Detalhe para a grade do motor substituída por outra fabricada na própria oficina do Colégio, após se chocar com um poste. O pára-choque resistiu bravamente e o para- brisa nã quebrou.

Em poucos anos, a demanda aumentou consideravelmente, havendo a rápida necessidade de adquirir mais ônibus. Para que a manutenção fosse confiável, também se criou uma oficina própria, localizada atrás do clube Tamoio. Isto também reduziria os custos com a manutenção, pois lá se faria absolutamente tudo: mecânica, pintura, borracharia, abastecimento e depósito de diesel, adquirido em grande quantidade, diminuindo o preço do combustível e eliminando o risco de ficar refém dos preços mais caros dos postos de combustíveis convencionais. 

Movimentação das rotas saindo do Centrinho
    
             Através das unidades Gonçalão (sede), Neves, Centrinho e Gonçalinho, o Colégio São Gonçalo chegou a ter cerca de 25 ônibus, conseguindo abranger praticamente todos os bairros da cidade de São Gonçalo e até alguns de Niterói, como Centro e Icaraí. Entre vários modelos, alguns foram considerados raridades nacionais no cenário da busologia, como o Metropolitana fabricado em 1970 do primeiro lote comprado pela 1001 – chegando a fazer a rota 1 e 3 - e funcionando como Rota Oficina nos últimos anos. Seu potente motor LPO-344 o possibilitava rebocar com grande facilidade as rotas que enguiçavam. Para isso foi feito um engate na sua traseira, ali era encaixado uma peça que o ligava à rota enguiçada, para ser levado à oficina. 

 Oficina do Colégio São Gonçalo - atrás do clube Tamoio  

Garagem do Colégio São Gonçalo, em seus últimos dias de funcionamento, atrás do Clube Tamoio

Engate do Metropolitano 1970, para rebocar os demais ônibus

 Entre outros modelos notáveis estavam o Ciferal Urbano 1976, Ciferal Tocantins 1978, Caio Gabriela 1979 e Ciferal Alvorada (curto) 1986. Outro mais comum era o Ciferal Alvorada  (rota 1).


 Ciferal Alvorada - na foto, ele já havia sido vendido - fazia a rota 1


Ciferal Urbano - 1976 - próximo à oficina

Ciferal Tocantins 1978

Caio Gabriela 1979 - na foto, ele já havia sido vendido - fazia a rota 6

Ciferal Alvorada (curto) 1986 - fazia a rota 11 - na foto, ele já havia sido vendido a uma Igreja de São Gonçalo

 Os últimos modelos adquiridos foram cinco unidades do modelo Marcopolo Torino (1993). Com a crise do Colégio São Gonçalo a partir de 2008, alguns foram vendidos aleatoriamente para pagar motoristas, monitoras e mecânicos. Em janeiro de 2010, todos eles foram vendidos. Com isso, a quantidade de alunos reduziu drasticamente. No final do mesmo ano, cerca de 500 alunos estavam matriculados (número muito inferior aos cinco mil dos anos anteriores). Sem saída e com muitas dívidas, o Colégio São Gonçalo fechou suas portas.

Marcopolo Torino 1993 - repousando na garagem do Colégio - este fazia a rota 5

Vários ônibus foram comprados pelo Ricardo Pericar, atualmente, vereador de SG. Alguns foram revendidos para igrejas de Nova Iguaçu e Queimados. Um foi transformado em ônibus trio elétrico e outro em trem. Algumas raridades ainda permanecem com Pericar, como o Metropolitana 1970 e Caio Gabriela 1979. Todos estes ônibus são símbolos da história educacional de São Gonçalo e do transporte brasileiro. O modelo da carroceria Metropolitana, por exemplo, é último modelo que se tem notícia da série 1970. Devido à sua extrema raridade, sua preservação e restauração é esperada com grande anseio pelos amantes de ônibus antigos.

Ônibus transformado em trenzinho

Ciferal Tocantins 1978 - vendido para Queimados

Ciferal Tocantins 1978 - transformado em Trio Elétrico

Ciferal Tocantins 1978 - vendido para uma Igreja de Nova Iguaçu - fez as rotas 10 e 13

Metropolitana 1970 - resistindo, bravamente, nos dias atuais. Sua preservação e restauração é esperada com grande anseio pelos amantes de ônibus antigos.


Sobre o autor:      
José Eduardo Testahy dos Santos Júnior estudou no Colégio São Gonçalo entre 1993 e 2006. Busólogo e graduado em Psicologia na Universidade Estácio de Sá. Nas horas vagas escreve em seu site, www.testahy.com.br.  















                                                                  
 

5 comentários:

  1. Fico muito feliz de ter escrito este texto. Pode contar comigo sempre, amigo Agilberto. Coloquei o banner do seu blog no meu como blog parceiro. Coloca o meu no seu também?
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    1. Querido Testahy, feliz estou eu em ter vc. como colaborador, claro que vou compartilhar o seu blog, que, aliás, é sensacional, mas tenha paciência, pois estou com problemas técnicos de web desig, rsrsrsrsr.

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  2. Excelente texto, como também raras fotos, abrilhantando a maravilhosa contribuição para a história do transporte do município de São Gonçalo...

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  3. Estudei no Colégio S.Gonçalo entre 1966 e 1972, e fiquei muito triste com o fechamento desse estabelecimento que sempre foi uma referência em nossa cidade. Fiquei sabendo de coisas, que para mim eram até ler esse blog eram desconhecidas, como a oficina dos ônibus.

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  4. Estudei toda a minha vida até 1993 e fiquei muito triste em saber do fechamento do Colégio São Gonçalo.... muito triste mesmo

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