quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Domingo no Parque - Tivoli Park


terça-feira, 9 de janeiro de 2018


Domingo no Parque – Tivoli Park


Toda criança é apaixonada por um parque de diversão. Eu não fui diferente, até um período da minha infância.

Foi num domingo do ano de 1985, eu com 13 aninhos. Embora fosse uma criança desde pequeno sempre tive um biotipo avantajado para os padrões de um menino da minha idade. Bom, vamos ser sincero, gordinho. Tá bom, vamos ser mais sincero ainda, GORDO. Assim como eu era apelidado entre meus amigos de infância, e era esse apelido que muitas vezes deixava minha avó fula da vida quando um desses amiguinhos me gritava na porta de casa para sair para brincar:  -GORDO !

- ELE É GORDO PORQUE ALMOÇA E JANTA ! Gritava dona Olívia da cozinha, com a colher de pau na mão onde na maioria das vezes estava  preparando o rango para o jantar.

Para piorar, a genética também não ajuda. Como um legitimo descendente de alemão sempre fui grandão. Só para constar, no jardim de infância, sabe  aquela fila indiana que nos colocam um atrás do outro com mãozinha no ombro sempre do menor para o maior? Eu era sempre o ultimo da fila. Mas você deve estar se perguntando o porquê dessa minha narrativa que é um bulling de mim mesmo. Bom, vocês entenderão no decorrer do texto.

Vamos voltar naquele domingo de 1985 onde amarradão assistia  o programa Domingo no Parque do Silvio Santos. Era aquele programa que trancavam a criança em uma cabine em formato de foguete, colocavam um fone de ouvido na pobrezinha e ela tinha que dizer sim ou não quando acendia a luz vermelha. Enquanto isso o Silvio fazia troca-troca dos prêmios. E era cada uma. “Você quer trocar um carro zero quilômetro por uma caixinha de fósforo?”. Eu naquela adrenalina do programa, fui interrompido pela minha mãe me perguntando seu gostaria ir ao Tivoli Park.  “-SIM!”, soltando um grito como se tivesse no programa do Silvio. Talquinho no sovaco e gel no cabelo fui eu com minha família à sensação dos anos 80.

Silvio coloca sua filha Daniela para participar do programa

O parque foi criado pelo já famoso empresário circense, Orlando Orfei em 1972 que não economizou para trazer  brinquedos de ultima geração para o terreno cedido pelo então governador do Estado da Guanabara, Chagas Freitas. Esse terreno ficava as margens da Lagoa Rodrigo de Freitas onde hoje se encontra o Parque dos Patins. O nome foi inspirado no segundo parque mais antigo do mundo, Parque Tivoli, em Copenhage, capital da Dinamarca. Inaugurado em 1843 por concessão do Rei da Dinamarca Cristiano VIII para Georg Carstensen que convenceu o monarca usando uma bela justificativa. “Quando as pessoas estão se divertindo, elas não estão pensando em política”.

Tivoli Park na Dinamarca

Mas voltando ao domingão, logo que minha mãe estacionou o chevetinho SL 80 vermelho abri a porta e corri para fila da bilheteria que estava gigantesca. Meu pai com meu irmão no colo só soltou um “calma garoto”.   

Assim que passamos o portão de entrada vi que não era só a fila da bilheteria da entrada que era gigantesca, mas cada brinquedo tinha uma fila  que dava volta no quarteirão. Com certeza quem estava disposto a ter minutos de diversão tinha que penar por horas na fila.

Logo que entrei no parque o brinquedo que me chamou a atenção não foi a famosa Montanha Russa Espacial, aquela que dava um duplo salto mortal em piruetas. Me  enjoa só de imaginar. Foi logo ali na entrada mesmo, que meus olhos brilharam quando avistaram um brinquedo com varias lanchas de cores diferentes que boiavam e giravam em circulo  como um carrossel dentro de uma piscina circular.   

Comercial do Tivoli com ênfase na Montanha Russa Espacial (1983)

Então eu e minha mãe nos posicionamos na fila e cada passo me imaginava pilotando minha lancha sobre as ondas do oceano.

Foram mais ou menos 30 minutos na fila de espera até que chegou a hora. Cada lancha comportava duas crianças, então teria companhia na minha aventura.  A lancha comportava duas crianças, mas não uma “criançona”. Assim que me viu o operador do brinquedo fez um gesto com a mão negando a minha entrada e falou:

- Não posso colocar você na lancha, pois você é muito grande.

Minha mãe comprou logo a briga. Sabe como é mãe, está sempre aposta para defender seu filho.

 - Como assim! Meu filho vai sim entrar nessa @$#@$@ (ela adorava um palavrão )

-Não pode senhora, olha o tamanho do seu filho.

- Claro que pode, meu filho tem treze anos e a placa do brinquedo limita a idade para quinze anos. Esbraveja ela enquanto anda e gesticula em direção à placa de instrução do brinquedo.

Essa discussão já durava mais de 20 minutos com o brinquedo parado. Olho ao redor e o que vejo é aquela plateia e alguns até dando pitaco: “- Deixa o gordinho brincar.” Eu queria abrir um buraco na terra como avestruz e colocar minha cabeça dentro.

-Mãe, deixa pra lá. Não quero mais ir no brinquedo.

- Haaaaaá, você vai sim! Agora a briga é comigo. Quero falar com o diretor do parque.

Então um segurança que só acompanhava o bate papo caloroso pediu que o acompanhássemos, pois nos levaria ao diretor.

Ao entrarmos em uma ampla sala com três mesas em cada canto, uma das mesas se destacava e lá um senhor sexagenário com um pequeno topete dourado que não escondia os fios de cabelos brancos e uma costeleta que se destacava nos atendeu. Com um sotaque italiano e uma voz calma o senhor  abriu o dialogo com a minha mãe.

- Boa tarde, me chamo Orlando Orfei e sou o responsável pelo parque. Em que posso ajudar?

Naquela época não sabia, mas estávamos diante de um mito. Orlando Orfei nasceu em 8 de julho de 1920 na Itália, Foi um dos maiores empresários circenses e adotou definitivamente o Brasil como moradia no fim da década de 60 quando veio participar do Festival Mundial do Circo no Maracanãzinho.  Alem de empresário, foi pintor, escritor, dublê e ator de cinema, mas sem dúvida o que ele mais gostou foi ser domador de leões. Orfei recebeu várias condecorações e foi recebido por 4 Papas. Faleceu aos 94 anos no primeiro dia do mês de agosto de 2015 no município de Duque de Caxias onde morava.

Orlando Orfei (08/07/1920 - 01/08/2015)

- Olha só senhor Orfeu...

- É Orfei senhora.  Cortou ele antes que a minha mãe prosseguisse. E ali, fiquei sabendo que nem ela tinha ideia de quem era aquele homem.

- Olha aqui senhor Orfei, a gente enfrente uma fila do @$@#@$ (acho que já falei que minha mãe adorava um palavrão) e quando chega na hora do meu menino brincar ele é barrado pelo seu funcionário! Isso é uma sacanagem. Balbucia minha mãe vermelha de raiva.

- Calma senhora, vamos resolver o seu problema. Sente-se por favor. Quer um cafezinho? Foi passado agora mesmo. Está ótimo. E com toda tranquilidade do mundo, Orfei começava a utilizar sua técnica de domador, pois diante dele a minha mãe era mesmo uma leoa protegendo a sua prole.  

E continuou...

- Que garotão bonito que a senhora tem. Quantos anos você tem garoto?

- 13. Respondi sem muitas palavras.

- A senhora já deve ter uma lista grande de pretendentes a nora.

Orfei já ganhava a simpatia de minha mãe. Qual é a mãe que não gosta de ter seu filho elogiado. Afinal, toda mãe é coruja. Por mais feio que ele seja, pra ela é sempre um Kauã Reymond.

- Ele é lindo mesmo. Disse ela com o rosto ainda vermelho, mas não mais de raiva.

- Olha só, vamos fazer o seguinte. Seu filho vai poder sim andar no brinquedo, porem vamos coloca-lo sozinho sem a companhia de outra criança e no meio para equilibrar o peso. Assim não terá perigo de seu filho se molhar. Falou Orfei com o sorriso no rosto.     
- Tá bom. Foram as únicas palavras que minha mãe pronunciou.

-Vou pedir para o Sérgio, o nosso segurança que trouxe vocês, acompanha-los até o brinquedo e passar para o operador como proceder.

E assim foi feito, após nos despedir do dono do parque fomos levados até o brinquedo e assim que o segurança passou as ordens vinda do QG do parque pelo próprio general, minha mãe não conseguiu conter aquela cara de ganhei a guerra. Mas, enquanto minha mãe comemorava eu cumpria apenas a obrigação de sentar e ali ficar rodando sem mais emoções. Torcendo para que fosse o mais breve possível. Não existia mais  aquela fantasia de navegar pelo oceano. Era só eu parado e sentado no meio daquela lanchinha verde que rodava, rodava, e rodava.

- Acena pra mamãe. Insistia ela.

Ainda bem que naquela época não existia telefone celular com câmera e muito menos Facebook, pois tenho certeza que meu mico se eternizaria. Hoje escrevendo esse texto lembro-me daquele momento como a recomendação do capitão dos Pinguins no filme de Madagascar. Apenas sorria e acene. Mas sorrir era demais então apenas acenei.


Assim como no programa Domingo no Parque do Silvio Santos, tudo na nossa vida é questão de escolha. É um SIM ou um NÃO. Mesmo que não consigamos enxergar qual o prêmio que a vida nos reserva. Então, se pudesse voltar no tempo enquanto fantasiava-me na cabine do foguete do programa do Silvio eu teria gritado “–NÃO!” quando a luz vermelha acendeu através do convite de minha mãe. 


Alex Wölbert é o Blogueiro de "Histórias contadas por aí", colaborador do Blog do Vovozinho,  Blog  Tafulhar, da página Sim São gonçalo e, também, cronista do Jornal DAKI. Considerado um dos maiores cronistas do Leste Fluminense, sobretudo acerca da cidade de São Gonçalo-RJ. Faz parte do Projeto Recicla Leitores. Facebook: Alex Wölbert 

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